AS ORIGENS DA MAÇONARIA
Texto do Ir:. Rodrigo Medina Zagni (M:. I:.)
(Pós-Doutorado em História pela USP; Doutorado em Integração da América Latina pelo PROLAM-USP; Licenciado em História pela FE-USP; Bacharel em História pela FFLCH-USP)
Professor da Universidade Federal de São Paulo
Apesar de a Maçonaria ter origem formalmente moderna, haveria uma longeva anterioridade em que estruturas de alguma forma análogas em seus caracteres permitiriam afirmar uma genealogia para a qual são escassos os documentos e que, entre a mitificação e a análise crítica das fontes, pode-se dizer, constituem já regimes diversos de historicidade.
Ao concebermos a historicidade, por sua vez, como um conjunto bastante heterogêneo de elementos que, ao longo do tempo, significam o passado, as diversas significações atribuídas ao tempo ido (incluídas as mitificações e falseamentos) são partes do amálgama que constitui a história. Logo, para a escrita da história não basta destacar uma realidade objetiva daquilo que não tem confirmação.
Essa concepção, no debate historiográfico sobre as origens da Maçonaria, está ausente. Também os termos de uma História da Cultura que já está atada, firmemente, a cabedais teórico-conceituais da Antropologia Cultural onde hibridismos[1], transculturações[2] e o multiculturalismo[3] são conceitos já consolidados junto de categorias fundacionais como as do relativismo[4], do etnocentrismo[5] e da aculturação[6].
Centrado o debate em termos estritamente cronológicos e no procedimento de validação de datas por meio da análise do documento escrito (a crítica interna e externa das fontes formais[7]), ele resulta empobrecido e muitas vezes estéril.
Com isso, não chega a haver, propriamente, um debate de sentidos e significados, sobretudo, acerca de eventuais falseamentos e/ou erros de cronologia, mas o mero exercício de validação das datações. É como o tolo que vendo alguém apontar para a Lua, fixa sua atenção no dedo que aponta.
O que chamamos de historicidade, como componente da realidade histórica, não se expressa pura e simplesmente naquilo que confere autenticidade ao escopo da reconstituição do passado, destacando a história de narrativas mitológicas, lendárias e ficcionais. O que é histórico não diz respeito ao que “verdadeiramente ocorreu”; mas a como segmentos distintos de sociedade atribuíram sentidos e significados ao tempo vivido, ainda que essas significações envolvam distorções da realidade. Sobretudo para os mitos, lendas e ficções, é imperativa uma análise social dessas elaborações buscando-se determinar aspectos das mentalidades e os termos conflitivos dos segmentos de sociedade que as produziram.
Mas e quanto ao falseamento e/ou erro cronológico? Mormente a deformação de cronologias tem propósito e a análise histórica não se encerra ao afirmar equivocado e/ou falsificado um registro de datação; na verdade, a investigação histórica deveria ser aprofundada a partir deste ponto, ao invés de encerrada. Precipuamente porque o flanco aberto (e talvez ele importe mais do que a dita “verdade”) é o de uma “história social da mentira”. Sem pisar nas areias movediças dos relativismos, significa compreender os usos sociais da mentira e como, posta a circular e a conformar entendimentos, ela se converte numa determinada verdade, dada a sua existência em sentidos e significados que fundem, ao entendimento da realidade, formas distorcidas dela.[8]
Não é tão simples, como querem os ritualistas! Para o historiador, a ausência de conteúdos documentais ou contestações sobre temas recorrenciais (como a condição de Maçonaria Operativa para medievas confraternidades de Ofício; a passagem de uma Maçonaria Operativa para uma Maçonaria dos “Aceitos”; a coerência entre Maçonaria Operativa e Maçonaria Simbólica; o vínculo entre templarismo e Maçonaria; a origem hermética de muitos de seus conteúdos; uma eventual ligação com os colégios romanos de arquitetura, entre outros temas pisados e repisados sem o cuidado criterioso da análise crítica das fontes) não finda o debate sobre eles; pelo contrário, deveria inaugurá-los.
À guisa de exemplo, de alguma forma o templarismo penetrou no mundo maçônico; ainda que não tenha sido trazido, muito provavelmente, por um cavaleiro templário, legitimamente investido, vestindo cota de malha e empunhando o estandarte da Ordem, em sua montaria. Não há como depurar a Maçonaria desses conteúdos, como tem sido defendido em determinados círculos; é preciso analisar por quais meios e imperativos da realidade social se deu essa penetração. O mesmo para repertórios herméticos, ciências totêmicas, martinismo, cristianismo e uma miríade de conteúdos de proveniências muitíssimo diversas no tempo e no espaço.
Para a inquietude daqueles alienados por “visões de purismo” e pelo “fetichismo da forma”, a Maçonaria não é apenas uma instituição: é um campo de produção de sentidos. Ela não possui uma única origem; mas diversos marcadores originários dada a sua condição híbrida de constituição e para a qual um “documento de fundação” não basta para uma correta escrita da história.
Caminhemos então nessa seara, concebendo como parte de uma História da Maçonaria (que está longe de ter sido escrita) os seus distintos regimes de historicidade.
É nesta marca, a da historicidade, que podemos encontrar, numa comum historiografia brasileira, esse tipo de narrativa que busca atar as origens da Ordem a um passado muito anterior à primeira metade do século XVIII, quando se dá a existência documental do que podemos afirmar como Maçonaria moderna.
Por exemplo, em Augusto Franklin Ribeiro de Magalhães, é afirmada a existência de uma primeira organização de essência e caráter maçônico[9] já no ano de 704 a.C., quando o segundo rei de Roma, Numa Pompílio, estabeleceu um sistema de colégios de artesãos cuja estrutura tinha em seu topo o “Colégio de Arquitetos”, este que agregava construtores gregos oriundos da África e que trouxeram para esses círculos uma densa carga de conhecimento hermético. A referência ao deus grego Hermes e, portanto, à Antiguidade Clássica, permitiria estabelecer, por sua vez, outro nexo de sentido com repertórios de origem ainda anterior: a ciência egípcia, na forma dos cultos rendidos ao deus “Toth”[10]. Essa elaboração narrativa tenta afirmar uma linhagem antiga para uma moderna instituição; procedimento comum às buscas por legitimidade, alocando-as, desde um marcador moderno, num passado concebido como presente-anterior, atribuindo-se muitas vezes consciência alheia ao mesmo passado.
Nessas elaborações, estaria dada a origem dos “Colégios Romanos” que, por sua vez, obedeciam às leis de Sólon “o legislador”. Buscam-se nelas similaridades que tendem a anular processualidades históricas muitíssimo distintas e de longa duração que apartam tempos e sociedades, como se a história consistisse em fluxos de continuidade onde tudo evolui, ocultando-se rasuras a fim de construir (e não simplesmente destacar) permanências.
Dessas “similaridades”, tornou-se comum sublinhar que os “Colégios Romanos” reuniam-se em “Logias” para sessões secretas, organizavam-se em 3 graus: aprendizes, companheiros e mestres, juravam segredo sobre tudo o que ali se passasse e a ajudar fraternalmente todos os que, parte de seus quadros, estivessem em estado de necessidade, reconhecendo-se uns aos outros por meio de sinais, toques e palavras e tendo suas sessões presididas por um mestre eleito (cujo mandato seria de 5 anos), assessorado por dois inspetores ou vigilantes.
Rizzardo da Camino, autor que gozou, no Brasil, da condição referencial numa escrita da história circunscrita a pouquíssimos estudiosos, afirmou que esses colégios teriam seguido com a mesma estrutura até meados do ano 1200, quando então passaram a dar lugar às guildas ou corporações[11], proto-sindicatos que eram compostos por trabalhadores de um mesmo ofício.
Nas medievas guildas de construtores, sacerdotes cristãos é que teriam levado este modelo de organização aos monastérios encarregando-se também da edificação dos conventos e catedrais, fundindo-se, portanto, guildas de construtores com as corporações de construtores de catedrais e, com isso, facultando a penetração de uma densa carga de cristianismo ao repertório hermético já comum a essas “lojas”. Suas conexões com uma Maçonaria moderna seriam desveladas, entre outros indícios, pela forma como eram chamados os monges medievais: “massoneri”.
Cada corporação guardava os segredos de seu ofício e os administrava em 3 graus iniciáticos: aprendizes, companheiros e mestres. Isso para dizer que, nas oficinas medievais, a fim de aprender uma nova profissão, o novato iniciava seus trabalhos como aprendiz, orientado de perto por um mestre de ofício e após aprender os preceitos básicos daquele mister passava ao grau de jornaleiro (porque trabalhava por jornadas), também chamado de grau de companheiro (porque acompanhava o mestre). Ao elaborar sua obra-mestra (“obra prima”) era submetido a uma banca de mestres daquele mesmo ofício, incumbidos de examiná-la e de avaliar suas habilidades submetendo-o a arguição. Apto, seria feito mestre de ofício, credenciado a orientar novos discípulos, podendo com isso passar a residir no mesmo local que seu mestre e sendo considerado parte da mesma família ou frátria: a fraternidade de ofício, mais do que um simples lugar de trabalho.[12]
Como os construtores de catedrais eram requeridos em toda a Europa, rapidamente esses monges construtores e também obreiros externos aos quadros clericais, bem como suas guildas, difundiram-se pelo continente, registrando-se sua chegada, ainda no século XII, aos principados e ducados germânicos com a fundação de uma das mais importantes organizações alemãs: a “Corporação de Steinmetzen”, que reuniu às guildas todos os trabalhadores de pedra com base na organização das lojas romanas, subordinando-lhes à autoridade eclesiástica.
Magalhães identifica que dessa organização tem origem a “Confraternidade dos Canteiros de Estrasburgo”, que em 1275 realizou uma convenção de todas as lojas de construtores, afirmando tratar-se da primeira convenção da Ordem se considerarmos esta organização como uma Maçonaria de Ofício, ou Maçonaria Operativa[13], apesar de não ter reivindicado para si essa designação que, como signo de distinção, só passa a ser usual com o advento de uma Maçonaria Simbólica, na primeira metade do século XVIII.
Até então, as lojas operativas ou de ofício, em toda a Europa, obedeciam a um conjunto vasto de normas que, reunidas no final do século XIV, seriam ulteriormente designadas como “Antigas Obrigações” (as “Old Charges”), de caráter profundamente moral e na qualidade jurídica de direito consuetudinário, tradicional ou costumeiro. De igual forma, a nomeação de um repertório normativo como “antigo” só faz sentido, como referência, a um padrão estabelecido como “moderno”. Trata-se de uma atribuição de sentido que não é contemporânea, por óbvio, ao tempo dessas “obrigações”; trata-se de feito muitíssimo posterior e que pode indicar não o passado, propriamente, senão a sua idealização conforme produzida em diferentes momentos, em distintas realidades.
Os “Manuscritos” ou “Old Charges” advêm, em sua grande maioria, do “Poema Regius”, de 1390 (dizendo respeito a estruturas completamente distintas daquelas que o século XVIII pariu como Maçonaria Simbólica) constituiriam a base moderna da Ordem. O argumento, amplamente difundido pela literatura maçônica, tem sido justificado pelo fato de seus princípios fundamentais não terem sido modificados pelas posteriores constituições de distintas Obediências.
Assis de Carvalho refere a existência de mais de 140 manuscritos contendo as “Old Charges”. O problema é que, ainda que haja um número abundante de manuscritos, raras são as obras que deram a saber de sua existência ou que os analisaram.[14]
Recuperado o diário do médico e antiquário William Stukeley, iniciado na Loja da Taberna “Salutation” (“Saudação”), em Londres, consta a informação de que as “Old Charges” teriam sido coligidas por George Payne (que afirmou ter sido Grão-Mestre da Grande Loja de Londres e Westminster de 1718 a 1720) na forma do manuscrito “Cooke”, o registro mais antigo dessas “Obrigações”, apresentado no Stationer’s Hall a propósito da posse do Conde de Montagu, como Grão-Mestre, aos 24 de junho de 1721.[15]
Na lógica comum ao processo de formação dos Estados Modernos, na transição feudal-capitalista, a complexização institucional que afetou uma série de organizações, na lógica de uma racionalidade crescente da vida social, repercutiu, na prática da organização das guildas, na substituição paulatina do direito consuetudinário por uma forma jurídica de caráter positivo (dogmático, burocrático e hierarquizado); com isso, os manuscritos fundamentaram as primeiras constituições dessas corporações.
Deste processo resultaram: em 1459 as “Constituições de Estrasburgo”; em 1462 as “Ordenações de Torgau”; e em 1563 o “Livro dos Irmãos”. Contudo, essa tradição jurídica germânica, para as guildas, chegou ao fim em 1681 com a invasão francesa e, derradeiramente, em 1731, quando um decreto da “Dieta Imperial” (órgão deliberativo da Confederação dos Estados Germânicos) pôs fim à “Fraternidade de Steinmetzen”.
É importante também frisar que no processo formativo dos Estados modernos, nos quadros do Antigo Regime e no compasso cada vez mais acelerado da transição entre feudalismo e capitalismo, o redimensionamento do poder político da Igreja, quando do assentamento do Absolutismo no Ocidente, fez com que, paralelo à ampliação das corporações por toda a Europa, verifique-se o seu desligamento progressivo dos mosteiros e sua paulatina descristianização. O fenômeno está relacionado às mudanças estruturais em curso, com a necessária readequação da Igreja aos imperativos dos recém-nascidos Estados Modernos, convertendo-se, de unidade espiritual da cristandade latina, em anteparo do poder eclesiástico-civil[16].
Os últimos manuscritos, que antecederam imediatamente ou que foram contemporâneos à publicação das primeiras constituições maçônicas, foram os de Papwort, Roberts, Macnab e Hardon, entre 1714 e 1723, estando presentes em constituições e manuais de algumas Grandes Lojas até hoje.
Há que se anotar ainda o fato de que, paralelos aos manuscritos e às Constituições surgiram os ritos, registrando-se a existência, hoje, de mais de uma centena de ritos maçônicos, sem considerarmos as incontáveis variações, no mesmo rito, em Orientes, Obediências e lojas distintas. Quanto a sua essência, a diferença elementar é a de que enquanto os ritos determinam a dinâmica dos trabalhos em loja; nos manuscritos e constituições, segundo argumentou Camino, dá-se norma ao comportamento moral e social de seus quadros.[17]
As Constituições Maçônicas só foram compiladas em 1723 por James Anderson, publicadas pela primeira vez naquele mesmo ano e acabando por tornarem-se conhecidas como a “Constituição Maçônica de 1723” ou ainda como a “Constituição de Anderson”.
Segundo Carvalho,
“embora, contendo muitas falhas históricas é, sem a menor dúvida, o mais importante Livro Maçônico, publicado, em todos os tempos. Sendo mesmo, o Primeiro Livro Maçônico publicado pela Maçonaria Especulativa, ou dos ‘ACEITOS’”[18].
Seu objetivo geral era o de compilar os antigos usos e costumes da Fraternidade, as “Old Charges”, acrescendo-lhes normas administrativas necessárias ao funcionamento da primeira estrutura obedencial da Maçonaria Simbólica: a Grande Loja de Londres e Westminster, que teria sido fundada, conforme reproduziram autores maçônicos de distintas proveniências, em 1717, em Londres. Eis a baliza afirmada e reafirmada, por três séculos, como a origem da Maçonaria que conhecemos hoje.
De acordo com uma cronologia amplamente difundida (mas que não aparece na primeira edição da “Constituição de Anderson”, de 1723), o marco de 1717 teria sido crucial para a história da Maçonaria, isso porque divisaria a grande transformação da “Maçonaria de Ofício”, ou “Operativa”, para a “Maçonaria dos Aceitos”, que daria lugar, por sua vez, a uma “Maçonaria Especulativa”. A passagem teria ocorrido quando quatro Lojas Operativas inglesas julgaram oportuno fundirem-se sob a autoridade de um mesmo Grão-Mestre. Teriam sido elas: 1) a Loja da Cervejaria “The Gosse and Gridiron” (“O ganso e a grelha”); 2) a Loja da Cervejaria “The Crown” (“A coroa”); 3) a Loja da Taberna “The Apple Tree” (“A macieira”); e 4) a Loja da Taberna “The Rummer and Grapes” (“O copázio e as uvas”).
Primeiramente, a reunião teria ocorrido na Loja “A Macieira”, em Covent Garden, em 1716, que ao eleger, como Venerável, o mestre mais antigo entre seus mestres constituiu, com isso, uma Grande Loja “pro tempore”. Desta reunião, teria sido deliberada a realização de uma assembleia anual, a propósito das festividades maçônicas do dia de São João, e que teria uma primeira tarefa: escolher entre eles um Grão-Mestre.
Aos 24 de junho de 1717, a “Assembleia dos Maçons Livres e Aceitos”, realizada na Cervejaria “O Ganso e a Grelha”, próxima à Catedral de São Paulo, teria escolhido Anthony Sayer para Grão-Mestre, bem como Joseph Elliot e Jacob Lamball como Grandes Vigilantes, dando origem, com isso, à Grande Loja de Londres e Westminster, que distinguia-se de todas as organizações anteriores fundamentalmente por inaugurar um sistema obediencial em relação às lojas, bem como por passar a admitir elementos externos aos quadros de ofício, os “aceitos”, mudando gravemente sua natureza de ensinamentos da dimensão operativa para a especulativa.
No entanto, há registros da presença de quadros não-operativos (os “aceitos”), em lojas de maçons “operativos”, já em 1703, quando a Loja Saint-Paul, que operava em Londres, documentou a autorização para acolhimento de trabalhadores de diferentes profissões. O documento traz ainda, como justificativa, a importante informação de que essa já seria uma prática costumeira de outras lojas.
Essas inovações não foram bem vistas por boa parte dos maçons ingleses que seguiram mantendo “Lojas Livres” e que não reconheciam a autoridade dessa primeira Grande Loja.
Em 1719 teria sido eleito como Grão-Mestre o teólogo Jean Theóphile Désaguliers, intimamente ligado ao reverendo escocês James Anderson, ministro da Igreja Presbiteriana de Swallow Street, em Londres.
Existe, contudo, a possibilidade de nem Antony Sayer e nem seus ditos sucessores, George Payne (que teria sido Grão-Mestre de 1718 a 1720) e John Desaguliers (que estranhamente afirmou ter sido Grão-Mestre em 1719!), terem sido Grão-Mestres; bem como de o Conde de Montegu ter sido, quando empossado em 1721, o primeiro Grão-Mestre da então Grande Loja de Londres e Westminster. Mas antes de adentrarmos a esta contenda, fiquemos com o marco de 29 de setembro de 1721, quando foi solicitado a Anderson que procedesse a compilação dos antigos preceitos, costumes e regulamentos vigentes na Franco-Maçonaria Operativa, incluindo-se a essência dos manuscritos, as “Antigas Obrigações”, somando-se normas de caráter administrativo, também de conduta moral, a serem observados por todos os Maçons submetidos à nova Obediência.
Intocada por três séculos, essa cronologia tem sido hoje severamente questionada. É o que procederam os historiadores Andrew Prescott, professor do King’s College de Londres, e Susan Mitchell Sommers, docente do Saint Vincent College. As primeiras críticas mais sistemáticas foram apresentadas, por ambos, em conferência sediada pela Loja de Pesquisas “Quatuor Coronati”, em parceria com o Queen’s College de Cambridge, no ano de 2015.[19]
No colóquio, Prescott e Sommers recuperaram questionamentos que já vinham sendo feitos, pelo menos, desde Henry Sadler que, em 1887, contestou a afirmação de Anderson de que as quatro Lojas que teriam fundado a primeira autoridade obedencial maçônica do mundo eram as únicas existentes em Londres, no ano de 1717[20].
Também resgataram os exercícios que tentaram a validação dos dados e argumentos apresentados por Anderson, de Robert Freke Gould e de Sir Alfred Robbibns, respectivamente em 1895 e 1909, e que não localizaram nos jornais ingleses quaisquer confirmações dos eventos que afirmou o reverendo terem ocorrido em Londres e, sobre os quais, a imprensa local, segundo os parâmetros que demonstraram terem ali vigorado, certamente teria repercutido.[21]
No mesmo ano em que Robbins apresentou suas interrogações na “Quatuor Coronati”, o historiador alemão Georg Emil Wilhelm Begemann afirmou serem invencionices as narrativas de Anderson sobre a eleição do primeiro grão-mestrado maçônico[22]. No entanto, Prescott e Sommers esclarecem que as críticas de Begemann não chegaram a ser reproduzidas, à época, pela “Quatuor Coronati”, e nem sobre elas instaurou-se qualquer debate, em razão da nacionalidade do autor, no conjunto das tensões que antecederam a deflagração da Grande Guerra.[23]
Mas não foram apenas as críticas de Begemann que não repercutiram; o mesmo (ainda que por outras razões) ocorreu com os textos de Saddler, Gould e Robbins; não havendo, portanto, um debate historiográfico sobre o repertório de narrativas e a cronologia elaborados por Anderson acerca da criação da Grande Loja de Londres e Westminster. Apenas em 2015 esses textos foram “retirados de suas prateleiras”, para que se somassem a eles novas fontes que, corroborando muitas de suas assertivas, comprometem severamente uma “História Oficial” da Maçonaria.
Quando Anderson foi chamado a produzir não apenas a compilação das normas (costumeiras e positivadas) mas uma “história” da Maçonaria, teria tido como ponto de partida o manuscrito “Cooke”, produzido por George Payne a apresentado à Grande Loja quando da instalação do Conde de Montagu. No entanto, o registro ali grafado de que Anderson era membro regular de uma loja maçônica, informa que ele compunha, naquele ano de 1723, os quadros da “Horn Lodge”, que teria operado em Westminster sob número “17” e cuja existência, de acordo com W. J. Songhurst, não pode ser confirmada.[24]
Tendo existido ou não a dita oficina (o que compromete a condição do reverendo como maçom regular), terminados os trabalhos de Anderson, o texto foi submetido ao exame de 14 especialistas que, após algumas alterações, aprovaram o documento publicado em 1723 como “As Constituições dos Franco-Maçons”, contendo fundamentalmente a história, as obrigações e os regulamentos da Ordem. No entanto, a “história” ali inscrita não contempla os eventos que Anderson disse terem ocorrido em 1716 e 1717; ele só escreveria a este respeito em 1738, quase 21 anos após a dita “fundação” da Grande Loja e, com isso, 15 anos depois de publicada a primeira Constituição.
O processo de revisão, segundo sugere o anúncio publicado por James Roberts (que dava a saber já da necessidade de uma nova versão) aos 23 de janeiro de 1723, no “Daily Journal”, não foi nada harmonioso e informa ter havido grave dissenso, no interior da própria Ordem, acerca dos conteúdos normativos e também alusivos à “história” da Maçonaria. Senão, vejamos:
“For the Benefit of the ancient Society of Free-Masons
Wheras there is now ready for Publication, a new Sett of Constitutions and Orders, very different from the Ancient, by which the said Society has been happily, and quietly, regulated, for many Ages past. This is to inform all Lovers of pure Masonry, abstracted from Innovations, and Self-Interest, that there will speedily be prepar’d, and deliver’d to them, without Cost, The Ancient Constitutions, and Orders, taken from the best Copies; wherein such Errors in History, and Chronology, which, by the Carelessness of the several Transcribers, have crept into them, will be fully rectified. The extravagant Length of the said new Constitutions, and Orders, exceeding that of four ordinary Sermons, makes it most evident, that they are calculated at the Expence and Damage of the Society, meerly to serve the Interest of one single Member, the Author, whose assurance was such, that he got them printed off before he offers them to the General Censure of the Fraternity. For which Reasons, we hope, the Brotherhood will not now be over hasty to encourage the said Innovator; For to show honourably and justly he deals by his dear Brother Masons, his whole Two and Six-penny Book will be speedily published, on as good Paper as his, at the Price of Six-pence; of which timely Notice will be given in this Paper.”[25]
[TRADUÇÃO: “Para o benefício da antiga Sociedade dos Maçons
Onde agora está pronto para publicação, um novo Conjunto de Constituições e Ordens, muito diferente do Antigo, pelo qual a referida Sociedade foi feliz e silenciosamente regulamentada por muitas eras passadas. Serve o presente para informar a todos os Amantes da Maçonaria pura, abstraídos das Inovações e do Auto interesse, que eles serão rapidamente preparados e entregues a eles, sem custo, As Constituições Antigas e Ordens tiradas das melhores Cópias; em que tais Erros na História e na Cronologia, que, pelo Descuido dos vários Transcritores, se insinuaram nelas, serão totalmente retificadas. A extensão extravagante das ditas novas Constituições e Ordens, excedendo a de quatro Sermões ordinários, torna mais evidente que elas são calculadas por Conta e Custo da Sociedade, apenas para servir aos interesses de um único Membro, o Autor, cuja garantia era tal, que ele as imprimiu antes de apresentá-los à Censura Geral da Fraternidade. Por quais Razões, esperamos, a Irmandade não se precipitará agora em encorajar o referido Inovador; Para mostrar que ele lida com honra e justiça com seus queridos Irmãos Maçons, todo o seu Livro de Dois e Seis Pence será publicado rapidamente, em um Papel tão bom quanto o seu, ao Preço de Seis Pence; do qual Aviso oportuno será dado neste Documento.”[26]
Como se pode ler, o alvo das críticas era o próprio Anderson, tomando como “inovador”, em termos pejorativos.
A recepção que teve o texto de Anderson, no ambiente maçônico, pode ser avaliada pelos esforços do mesmo James Roberts em anteceder, a ele, a sua versão das “Old Charges”, publicada em setembro de 1722 e que afirmou originadas de uma promulgação datada de 1663, por sua vez, baseada em um manuscrito que afirmava ter mais de meio milênio de existência.[27]
No “Daily Journal” de 7-10 de setembro de 1722, assim os maçons eram advertidos sobre o texto que vinha sendo escrito por Anderson:
“… to advise the Publick, that the same is false and spurious, nor does the said Book contain anything like the true Constitutions of the Society, but is calculated to deceive the Publick. Whereof we desire the Brotherhood to take notice.”[28]
[TRADUÇÃO: “… para avisar o Público, que o mesmo é falso e espúrio, nem o referido Livro contém nada como as verdadeiras Constituições da Sociedade, mas é calculado para enganar o Público. Desejamos que a Fraternidade tome conhecimento disso.”][29]
O livro original, como visto alvo de severas críticas desde o seu nascimento, era composto pelo frontispício e mais 91 páginas com a seguinte estrutura: 1) frontispício; 2) página título; 3) dedicatória; 4) História da Maçonaria ou da Geometria e Arquitetura, elaborada como síntese que pretendia dar conta da História da Maçonaria desde a “criação do mundo”, entendendo-se como marco inicial o próprio “Paraíso” e admitindo, portanto, a controversa cronologia bíblica, parte que é refutada hoje por absolutamente todos os historiadores da Maçonaria; 5) deveres de um Maçom; 6) pós-escrito, relatando a opinião de Lord Coke; 7) Regulamento Geral, consistindo num conjunto de 39 obrigações; 8) pós-escrito ensinando como constituir uma Loja; 9) aprovação; 10) canções – do Mestre, do Companheiro, do Aprendiz e dos Vigilantes; e 11) certidão e data.
O núcleo do documento são os “Regulamentos Gerais” e os “Antigos Deveres” que, de acordo com Castellani e Raimundo Rodrigues, “formam o texto que se tornou o instrumento jurídico básico da Moderna Maçonaria, ou seu suporte doutrinário, a guiar os Maçons regulares do mundo”[30].
Como sabemos, em junho de 1721 o Duque de Montagu assumiu o Grão-Mestrado; é este o marco para que notícias acerca da Maçonaria passassem a ganhar as páginas dos jornais londrinos. No entanto, nem nos escritos jornalísticos e nem nos próprios materiais de divulgação e de circulação interna da Grande Loja há menções sobre a sua fundação em 1717, ou mesmo acerca dos eventos que teriam ocorrido na Loja “A Macieira”, em 1716, ou da “Assembleia dos Maçons Livres e Aceitos”, na Cervejaria “O Ganso e a Grelha”; esses acontecimentos só seriam narrados por Anderson em 1738, quando terminada uma nova edição do “Livro das Constituições”.
Sobre os imperativos para o novo escrito, cumpre dizer que a natureza especulativa da Primeira Grande Loja, mais as inovações de caráter cerimonial, como pudemos colher da crítica de James Roberts, alimentavam o descontentamento de setores mais ortodoxos, conservadores e puristas da Maçonaria Inglesa.
Na metade do século XVIII, em função disso, eram precárias as condições administrativas da Grande Loja, culminando no desligamento de cerca de um quarto das lojas que operavam sob seus auspícios. Porquanto se ligassem a ela um número razoável de novas oficinas, isso fazia crescer ainda mais o descontentamento e as lojas que haviam sido proclamadas independentes, que seguiam mantendo práticas cerimoniais antigas, deram início a um forte movimento de oposição que contestava frontalmente a autoridade da Grande Loja.
Neste contexto é que a “Constituição de Anderson” fora revisada e republicada em 1738, já no fim da vida de Anderson e depois de conturbadas relações que levaram o reverendo a se reaproximar da Grande Loja apenas por volta de 1730.
O novo texto não dava conta, contudo, das fortes críticas provenientes das Lojas Livres. É nessa nova edição do “Livro das Constituições” que, pela primeira vez, é apresentada a informação de que a Grande Loja de Londres e Westminster teria sido “reavivada” em 1717 com a eleição de Antony Sayer como Grão-Mestre. Ela não teria sido “fundada” naquele ano, mas “reavivada”, isso porque, no texto de 1738, a origem da Maçonaria seria “adâmica”. Nas palavras de Precott e Sommers, a:
“masonry stretched back to Adam. He [James Anderson] declares that the first four Grand Officers were Noah and his three sons. The first Grand Master he names is Joshuah, the son of Abraham. According to Anderson, Grand Master Moses had Joshuah as his Deputy and Aholiah and Bezaleel as his Wardens.11 According to the list of Grand Masters of Freemasonry in England inserted by Anderson in the 1738 Constitutions on the instructions of Grand Lodge, the first Grand Master of Masons in England was St Augustine of Canterbury.12 For Anderson, 1717 was not the foundation of Grand Lodge, and the appointment of Antony Sayer as Grand Master was merely a means of reviving Grand Lodge after it had fallen into the doldrums at the end of Sir Christopher Wren’s life.” [31]
[TRADUÇÃO: “maçonaria remontava a Adão. Ele [James Anderson] declara que os primeiros quatro Grandes Oficiais foram Noé e seus três filhos. O primeiro Grão-Mestre que ele nomeia é Joshuah, o filho de Abraão. De acordo com Anderson, o Grão-Mestre Moses tinha Joshuah como seu Adjunto e Aholiah e Bezaleel como seus Grandes Vigilantes. De acordo com a lista dos Grão-Mestres da Maçonaria da Inglaterra inserida por Anderson nas Constituições de 1738 seguindo as instruções da Grande Loja, o primeiro Grande Mestre dos Maçons na Inglaterra foi Santo Agostinho de Canterbury. Para Anderson, 1717 não foi a fundação da Grande Loja, e a nomeação de Antony Sayer como Grão-Mestre foi meramente um meio de reviver a Grande Loja depois que ela caiu no marasmo no final da vida de Sir Christopher Wren”.[32]
O registro mais antigo da imprensa inglesa, sobre a Maçonaria, data exatamente da edição de 24 a 27 de junho de 1721, na notícia veiculada pelo jornal “Past Boy” sobre a posse de Montagu como Grão-Mestre. Dali por diante, com frequência os periódicos ingleses passaram a explorar o crescente interesse dos leitores sobre a Ordem.
O problema, em termos documentais, não é apenas a ausência flagrante de fontes jornalísticas, mas também de materiais maçônicos que passaram a se tornar comuns após o ano de 1721, com a posse do Duque de Montagu, como panfletos, textos de instrução e documentos maçônicos (sobretudo as atas e balanços financeiros), bem como de literatura antimaçônica (panfletos dessa natureza passaram a circular espelhando a visibilidade que a Ordem passou a ter na imprensa londrina). O problema ainda maior é o de que entre 1721 e 1738 (entre a posse de Montagu e a publicação da nova edição do “Livro das Constituições”) não há menções aos eventos de 1716 e 1717, a não ser por uma lista de Grandes Oficiais anexada ao primeiro “Livro de Atas” utilizado pela Grande Loja, na década de 1730.
A lista é o único documento deste período (de 1721 até 1738) que reafirma a informação de que o primeiro Grão-Mestre da Grande Loja teria sido Sayer, junto de Lamball e Elliot como Grandes Vigilantes. Coincidem, também, as informações acerca da composição dos grão-mestrados subsequentes, divulgadas em 1738 por Anderson. O documento foi elaborado, por sua vez, por William Reid, Grande Secretário nomeado em 1727; mas a crítica externa da fonte, debruçada sobre elementos paleográficos e de constituição físico-química da tinta utilizada para a escrita do documento, demonstram que ele teria sido inserido no “Livro de Atas” em algum momento entre 1731 e 1734[33]. Sem pisar o espinhoso caminho das intencionalidades, se houve erro da parte de Anderson, e tão somente isso, essa teria sido a sua fonte. Além desse registro, a única âncora que firma a narrativa da fundação da Grande Loja em 1717 é a de Anderson, assaz inconsistente.
Prescott e Sommers, para explicitarem o caráter questionável do registro documental em tela, informam que enquanto a primeira menção feita à eleição de Sayer como Grão-Mestre, em 1717, data de 1731-34; nas atas da Grande Loja a eleição de Desaguiliers e de Payne aparecem em novembro de 1728.
Na mesma conferência, valeram-se de fontes já conhecidas para impor a elas novos questionamentos. É o caso do já referido registro feito pelo por William Stukeley em seu diário, aos 6 de janeiro de 1721, dando conta de ter sido iniciado maçom na Loja da Taberna “Saudação”, na mesma Covent Garden onde já estaria estabelecida a “Macieira”, e que teria sido difícil reunir o número mínimo de maçons para realizar a cerimônia. As contradições com as informações dadas por Anderson, em 1738 (acerca de eventos que não presenciou), são muitas, principalmente sobre a criação de novas lojas após 1717, bem como pela proximidade com a “Macieira” que teria (se as informações prestadas por Anderson estivessem corretas), ao menos, 4 anos de existência.[34] E sobre a “Macieira”, os registros documentais que referem-na com esse nome aparecem somente depois de 1729.[35]
A hipótese mais provável, a fim de desemaranhar este novelo, é a de que apenas aos 24 de junho de 1721, com a instalação do Duque de Montagu como Grão-Mestre, no Stationer’s Hall, é que tenha sido fundada, de fato, a Grande Loja. É o que consta no “Livro E”, um livro de rascunhos pertencente à Loja de Antiguidade n° 2, e que tem inscritas atas e finanças das administrações a partir da década de 1750. Já no início do livro, a instalação de Montagu aparece descrita em ata que registra a administração empossada aos 18 de setembro de 1721 e modificações havidas até o ano de 1726. O livro foi doado à loja em meados de 1720, por um de seus membros, e a ata, submetida à crítica externa (sobretudo paleográfica), foi escrita no mesmo período dos eventos que registrou. A loja esteve, em 1778, no centro da disputa política pelo controle da Ordem e que culminou, por iniciativa do grupo ligado a William Preston, na destruição de uma série de documentos por ela guardados[36]. O “Livro E”, um simples livro de rascunhos, converteu-se, com isso, num dos mais importantes documentos contestatórios das narrativas elaboradas por Anderson e por três séculos constitutivas de uma “História Oficial” da Maçonaria. A ata, especificamente, “is the oldest contemporary account of a meeting associated with the Grand Lodge”[37] [“é o relato contemporâneo mais antigo de uma reunião associada à Grande Loja”][38].
Aos 17 de julho de 1751, as lojas dissidentes realizaram uma assembleia com o propósito de reviver a Antiga Arte Real, proclamando os antigos princípios e costumes do ofício como os únicos aceitos e verdadeiramente maçônicos. Tem-se, com isso, a fundação de uma Grande Loja rival à Primeira Grande Loja. A nova obediência se autodenominou como “Grande Loja dos Antigos”, isso porque defendia a manutenção de antigos princípios, rotulando a Primeira Grande Loja como “Grande Loja dos Modernos” por conta das inovações que sustentavam.
A Grande Loja dos Antigos, composta fundamentalmente por maçons irlandeses que haviam migrado para a Inglaterra, matinha costumes maçônicos herdados de sua terra natal. Totalizavam em torno de 80 obreiros divididos em 5 lojas, portanto uma média de 16 membros por loja, todas em Londres. Já a Primeira Grande Loja detinha o controle de 181 lojas. Contudo, em 1755, 46 lojas já haviam aderido à Grande Loja dos Antigos, no mesmo ano em que a Grande Loja dos Modernos atingia o número de 269 lojas.
O quadro de inferioridade numérica amargado pela Grande Loja dos Antigos começou a mudar apenas com a nomeação de Laurence Dermott para o cargo de Grande Secretário, aos 5 de fevereiro de 1752, que para fazer frente à Grande Loja dos Modernos, regida pela Constituição de Anderson, publicou em 1756 o “Ahiman Rezon”: a Constituição da “Grande Loja dos Antigos”. “Ahiman Rezon” é uma frase de origem hebraica, em sua etimologia conjugando três termos distintos: “ahim” (irmãos); “manah” (verbo escolher); e “ratzon” (lei); que articulados compõem a frase “conselho dado a um irmão”.
Segundo Dermott, tratava-se de um instrumento de defesa dos princípios e costumes da Antiga Arte Real, enquanto atacava os Modernos dizendo terem pervertido a pura Maçonaria nos seguintes pontos, assim elencados por Castellani e Rodrigues: 1) preparação incorreta dos candidatos à iniciação; 2) abreviação das cerimônias maçônicas; 3) omissão das orações; 4) omissão das prelações e dos sermões; 5) omissão da leitura das Antigas Obrigações aos iniciados; 6) transposição dos meios de reconhecimento do primeiro e do segundo graus; 7) uso de palavra incorreta no grau de Mestre Maçom; 8) descristianização dos rituais; 9) omissão das comemorações dos Dias Santos: São João Batista (24 de junho), São João Evangelista (27 de dezembro); 9) decoração incorreta dos templos; 10) inclusão dos toques e palavras de passe no próprio cerimonial, ao invés de coloca-los preliminarmente; 11) abandono da cerimônia de instalação do Mestre da Loja; 12) ausência de Diáconos como oficiais em suas lojas.[39]
A fim de firmarem sua autoridade em sua antiguidade, passaram a se autodenominar como “Maçons de York”, isso porque na cidade de York, no condado de Yorkshire, existiu o mais antigo centro operativo da Maçonaria, comprovadamente organizado com convenções realizadas desde o século X, precisamente desde 926.
Ocorre que em termos de conteúdo, ambos os documentos: a “Constituição de Anderson”, já a de 1738, e o “Ahiman Rezon”, de 1756, continham essencialmente as mesmas “Old Charges”, bem como obrigações sociais praticamente idênticas. O que distingue ambos os documentos é sua matéria religiosa: enquanto o “Ahiman Rezon” tem uma natureza mais espiritualista, a Constituição de Anderson tem um caráter de maior liberalidade.
Ocorre que as questões mais graves que opuseram as duas Grandes Lojas não se deram em razão pura e simplesmente de questões ascéticas. Sem a menor sombra de dúvidas, o tema de maior vulto é o Grau do Real Arco (o “Royal Arch”), que seria um quarto grau maçônico, defendido pela Grande Loja dos Antigos e não reconhecido pela Grande Loja dos Modernos. Não há consenso historiográfico sobre a origem deste quarto grau, sustentando parte da historiografia ter surgido entre maçons irlandeses, contudo, em período anterior à fundação da Grande Loja dos Antigos, isso porque o próprio Laurence Dermott foi iniciado neste grau em 1746, ou seja, 5 anos antes da fundação da Grande Loja dos Antigos; havendo registros de outra iniciação anterior, em 1744.
O quarto grau acabou servindo portanto de atrativo para aqueles que poderiam ir apenas ao terceiro grau na Grande Loja dos Modernos. Não apenas isso, segundo Castellani e Rodrigues, Dermott afirmava que os segredos do Mestre Maçom estavam contidos no quarto grau; enquanto no terceiro grau ministrado pelos “Modernos” tais segredos teriam se perdido.[40]
A estratégia rendeu à Grande Loja dos Antigos um rápido crescimento, enquanto a Primeira Grande Loja continuava se recusando a reconhecer o Real Arco; e por 15 anos os Antigos passaram a ocupar condição de vantagem numérica em relação aos Modernos. Até que em 1766, maçons modernos, sem nenhuma possibilidade de terem o Grau do Real Arco aceito por sua Grande Loja, fundaram o primeiro Grande Capítulo do mundo, o que por sua vez retirava da Grande Loja dos Antigos a exclusividade da transmissão daquele grau.
Mas é preciso fazer um breve parêntese, a essa altura, a fim de esclarecer que a História da Maçonaria e, por conseguinte das leis maçônicas, não se restringe ao ambiente exclusivamente inglês. Convulsionada pelas luzes, a saber, pelo avanço das ideias liberais na Europa, o Iluminismo francês tinha também maçons como interlocutores, como Voltaire. A própria tríade da Revolução Francesa de 1789: “liberdade, igualdade e fraternidade”, as divisas adotadas pela Maçonaria, revelam o envolvimento da Ordem em processos de transformação social que fundaram a própria contemporaneidade; mas não sem atritos com representantes das monarquias absolutistas europeias. Por exemplo, a oposição do rei Frederico da Prússia ao engajamento político e ideológico de parte significativa da Maçonaria Francesa, desvela uma outra profunda cisão na Maçonaria europeia. É preciso considerar que a Prússia conservadora tentou vencer em armas a França revolucionária durante as guerras napoleônicas, em nome do conservadorismo monárquico e de corte absolutista, movimento contrarrevolucionário que se opunha tanto ao republicanismo quanto ao constitucionalismo e que se sagrou vitorioso em 1815, quando à derrota napoleônica em Waterloo se impôs o Congresso de Viena[41]. A oposição é revelada pela publicação, em 1786, das “Novas e Secretas Constituições da Antiquíssima e Venerabilíssima Sociedade”, promulgadas pelo rei Frederico da Prússia e na qual a Maçonaria é definida como “esta instituição universal, cujas origens provêm do berço da Sociedade Humana”.
Mas se na Europa, em linhas gerais, a Maçonaria encontrava-se dividida (cisão que se estende ao Novo Mundo uma vez que os EUA são fundados nas lutas independentistas que envolveram ativamente maçons como George Washington, Thomas Jefferson e Benjamin Franklin contra a dominação colonial inglesa), na Inglaterra, enfim, a rivalidade entre as duas Grandes Lojas chegava ao fim em 1813 com a fusão das duas Obediências que, juntas, passaram a constituir a “Grande Loja Unida da Inglaterra” (a “United Grand Lodge of England”), que optou por trabalhar de acordo com os rituais dos Antigos, os “Antigos de York”, como se autodenominavam.
O “Grande Capítulo dos Antigos” deixava com isso de existir; enquanto o “Grande Capítulo dos Modernos” seguiu a funcionar como uma entidade separada, não sendo afetado pela união das duas Grandes Lojas.
A composição culminou, em 1815, na elaboração e publicação da “Constituição de Anderson Reformada” e cuja finalidade era a de servir de instrumento jurídico para a Grande Loja Unida da Inglaterra. Tal reforma ateve-se a aspectos metafísicos e religiosos do documento original, a fim de compor os interesses de Antigos e Modernos.
Próximo no tempo deste marco, em 1820 são promulgados, em Lausanne, os Estatutos Gerais da “Sociedade de Pedreiros Livres”, cujos objetivos “tem por fim o aperfeiçoamento do coração humano”; chegando-se à seguinte definição da Maçonaria: “a Sociedade dos Pedreiros Livres é de natureza eminentemente humanitária, ocupada a erigir Templos à Virtude e cavar profundas masmorras ao vício”.
Desse repertório normativo, que dá forma à Maçonaria desde tradições orais em tempos remotos até os mais complexos sistemas de codificação e complexização jurídica, destacamos um preceito sem o qual toneladas de legislações desmoronariam frente a perfídia e a desfaçatez que vez por outra rastejam entre nós: antes de sinais, toques e palavras, o maçom se faz reconhecer, sobretudo, por seus atos. Conscientes de que seus atos produzem resultados e que são portadores de sentidos e significados, cabe ao maçom orientá-los por meio de uma moral sã: esta que se define pelo amor ao próximo, independentemente de sua condição. É uma condição ética absolutamente indispensável ao maçom.
Nisso consiste o igualitarismo maçônico e que jamais pode dar lugar a práticas oligárquicas e aristocráticas ou a quaisquer formas discriminatórias. Defendemos a igualdade: o que não significa uma igualdade entre iguais, mas a isonomia que inscreve, inclusive, o direito de sermos diferentes.
Nisso consiste o princípio da legitimidade (quando atos estão em conformidade com um sistema moral dominante), ulterior a qualquer concepção de legalidade (quando atos estão em conformidade tão somente com um repertório jurídico-formal promulgado pelo Estado)[42], uma vez que, tomando emprestadas as palavras do poeta Carlos Drummond de Andrade: “os lírios não nascem das leis”.
[1] O hibridismo cultural é um fenômeno comum à aceleração dos processos de mundialização do capital em que, no plano da cultura, os complexos identitários são desenraizados e desterritorializados pela intensificação dos fluxos migratórios, uma vez deslocados contingentes humanos das periferias do sistema mundial para os centros de capitalismo desenvolvido, as “cidades globais”, onde as relações entre aqueles plenamente identificados com as referências culturais daquele lugar e os estrangeiros, que manifestam outros padrões de cultura, fundem seus sistemas de cultura pelo convívio cotidiano, ainda que em relações de assédio e resistência, produzindo-se mútuas transformações e a conformação de estruturas híbridas de cultura. Cf.: CANCLINI, Nestor García. Culturas híbridas. São Paulo: EDUSP, 2013; e BURKE, Peter. Hibridismo cultural. Madrid: Akal, 2010.
[2] De acordo com Bronisław Kasper Malinowski, a transculturação trata-se da transferência e incorporação de caracteres entre culturas diversas, “é um processo no qual se dá sempre qualquer coisa em troca do que se recebe. É um processo no qual as duas partes da equação saem modificadas. Um processo a partir do qual emerge uma nova realidade, composta e complexa, uma realidade que não é nem aglomeração mecânica dos caracteres, nem um mosaico, mas trata-se de um fenómeno novo, original e independente”. Cf.: MALINOWSKI, Bronisław Kasper.; “Prefácio”. In: ORTIZ, Fernando. Contrapunteo cubano del tabaco y el azúcar: advertência de sus contrastes agrários, econômicos, históricos y sociales, su etnografia y su transculturação. Caracas: Biblioteca Ayacucho, 1987.
[3] Trata-se da existência de diversos sistemas culturais num mesmo espaço de convívio social, aludindo à pluralidade de culturas. Cf.: BOURDIEU, Pierre. Razões práticas: sobre a teoria da ação. Campinas: Papirus, 1996.
[4] O relativismo é radicalmente contrário à tendência universalista do evolucionismo; ou seja, contra seu ímpeto de estender um mesmo repertório cultural à totalidade das sociedades, entendidas como inferiores. Cf.: BOAS, Franz. Antropologia Cultural. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2004; e DAMATTA, Roberto. Relativizando: uma introdução à Antropologia Social. Rio de Janeiro: Rocco, 1991.
[5] De acordo com este conceito, elaborado nos termos de uma Antropologia Cultural, não existem grupos ou culturas inferiores ou superiores a outras, mesmo que algumas detenham mais recursos tecnológicos e outros sejam considerados primitivos, são em verdade diversos. Seria um erro adotar uma postura etnocêntrica e considerar um complexo cultural superior ou inferior, em relação a outro complexo. Cf.: ROONEY, A.K.; VORE, P.L. de (orgs). You and the others: readings in introductory Anthropology. Cambridge: Erlich, 1976; e ROCHA, Everaldo. O que é etnocentrismo. São Paulo: Brasiliense, 1988.
[6] Decorrente do contato entre duas culturas distintas que, fundidas, dão origem a uma terceira cultura, refere-se também a relações assimétricas em que um padrão cultural passa a exercer sobre outro um papel de dominação, culminando na absorção da cultura dominada. Uma questão a se pensar é se no processo, ainda que assimétrico, a cultura dominante não assumiria traços da cultura subalternizada. Cf.: KUPER, Adam. Cultura: a visão dos antropólogos. Bauru, Edusc, 2002.
[7] Os procedimentos críticos em História foram sistematizados no século XIX, com a conformação das Ciências Humanas e o enfrentamento entre História e Erudição, resultando na relativa autonomia da ciência histórica que até ali se encontrava, como área do saber, diluída entre a Erudição e a Filosofia. A crítica histórica é o trabalho metódico sobre as fontes para verificar sua autenticidade, procedência e veracidade. Como etapa fundamental do método, pode ser dividida em interna e externa. Os elementos de crítica externa compreendem aspectos externos da fonte: autor, local (Geografia), época (Cronologia), tipo de escrita (Paleografia e Filologia) e tipo de material utilizado para a elaboração do documento. Já os elementos de crítica interna tratam dos conteúdos da fonte, numa primeira etapa centrada na coleta de informações: qualitativas (interpretação das informações) e quantitativas (quantificação do vocabulário); e uma segunda etapa de estabelecimento da autoridade do conteúdo: competência, exatidão e veracidade das informações. Cf.: GLÉNISSON, Jean. Iniciação aos Estudos Históricos. História Geral das Civilizações. Iniciação. São Paulo, Difusão Européia do Livro, 1961, pp. 31 e 32.
[8] Um estudo paradigmático, nestes termos, é o de Carlo Ginzburg acerca da crítica de Lorenzo Valla ao “Decreto de Constantino”, que doava um terço do Império Romano ao Papa Silvestre. O “Discurso sobre a falsa e enganadora doação de Constantino”, de Valla, atacava a legitimidade do documento e acabou denunciado como um manifesto anti-papal, caindo em descrédito, por mais coerência que houvesse na demonstração dos anacronismos e erros contidos na “Constitum Constantini”. A retórico cética de Valla, tanto quanto a falsificação do documento, foram analisados por Ginzburg de acordo com os interesses dos distintos segmentos de sociedade que determinaram e se valeram da sua produção, para muito além, com isso, de uma concepção positivista de “verdade documental”. Cf.: GINZBURG, Carlo. Relações de força: história, retórica, prova. São Paulo: Companhia das Letras, 2002.
[9] Ainda que não levasse o nome de Maçonaria, mas que, segundo o autor, se assemelhava demasiado a sua forma operativa.
[10] MAGALHÃES, Augusto Franklin Ribeiro de. Simbologia Maçônica. Rio de Janeiro: Trabalho e Justicia, 1976, p. 17.
[11] CAMINO, Rizzardo da. Rito Escocês Antigo e Aceito. São Paulo: Madras, 1999.
[12] DARNTON, Robert. O grande massacre de gatos e outros episódios da história cultural francesa. São Paulo: Graal, 2011, pp. 105-142.
[13] MAGALHÃES, Augusto Franklin Ribeiro de. Op. Cit. p. 19.
[14] CARVALHO, Assis de. A Maçonaria: usos e costumes. Londrina: A Trolha, 1995, p. 54.
[15] Cf.: PRESCOTT, Andrew; SOMMERS, Susan Mitchell; “1717 and all that”; Circulation Paper, Quatuor Coronati Lodge n° 2076, 2018 (disponível no link: https://www.quatuorcoronati.com/wp-content/uploads/2018/01/1717-And-All-That-Prescott-Sommers.pdf).
[16] Cf.: ANDERSON, Perry. Linhagens do estado absolutista. São Paulo: Brasiliense, 2004, pp. 15-57.
[17] Op. Cit.
[18] CARVALHO, Assis; “Prefácio”; in: CASTELLANI, José; RODRIGUES, Raimundo. Análise da Constituição de Anderson. Londrina: A Trolha, 1995, p. 16.
[19] PRESCOTT, Andrew; SOMMERS, Susan Mitchell; Op. cit. O texto da conferência foi traduzido por J. Filardo e encontra-se publicado sob título “1717 e tudo aquilo...”; Biblioteca Fernando Pessoa, 2015, (disponível no sítio: https://bibliot3ca.com/1717-e-tudo-aquilo/).
[20] SADLER, Henry. Masonic Facts and Fictions. Wellingborough: Aquarian Press, 1985, p. 15.
[21] GOULD, Robert Freke; “The Duke of Wharton”, Ars Quatuor Coronatorum, n° 8, 1895, pp. 114-155; ROBBINS, Sir Alfred; “The Earliest Years of English Organized Freemasonry”, Ars Quatuor Coronatorum, n° 22 , 1909, pp. 67-89.
[22] BEGEMANN, Georg Emil Wilhelm; “Early History and Beginnings of Freemasonry in England”; Library and Museum of Freemasonry, working paper, s/d, pp. 570, 577.
[23] PRESCOTT, Andrew; SOMMERS, Susan Mitchell; op. cit. p. 2.
[24] Cit. por Ibid. p. 8.
[25] Cit. por Ibid. p. 10.
[26] Traduzido por J. Filardo e publicado como “1717 e tudo aquilo...”; Biblioteca Fernando Pessoa, 2018, (disponível no sítio: https://bibliot3ca.com/1717-e-tudo-aquilo/).
[27] Cf.: HAMER, Douglas; JONES, G.; KNOOP, Douglas (eds.). Early Masonic Pamphlets. Manchester: Manchester University Press, 1945, pp. 71-83.
[28] Cit. por PRESCOTT, Andrew; SOMMERS, Susan Mitchell; op. cit. p. 10.
[29] Traduzido por J. Filardo e publicado como “1717 e tudo aquilo...”; Biblioteca Fernando Pessoa, 2018, (disponível no sítio: https://bibliot3ca.com/1717-e-tudo-aquilo/).
[30] CASTELLANI, José; RODRIGUES, Raimundo. Op. Cit., p. 16.
[31] PRESCOTT, Andrew; SOMMERS, Susan Mitchell; op. cit. p. 3.
[32] Traduzido por J. Filardo e publicado como “1717 e tudo aquilo...”; Biblioteca Fernando Pessoa, 2015, (disponível no sítio: https://bibliot3ca.com/1717-e-tudo-aquilo/).
[33] PRESCOTT, Andrew; SOMMERS, Susan Mitchell; op. cit. p. 3.
[34] Ibid. p. 4.
[35] Ibid. p. 7.
[36] Ibid. pp. 4 e 5.
[37] Ibid. p. 5.
[38] Traduzido por J. Filardo e publicado como “1717 e tudo aquilo...”; Biblioteca Fernando Pessoa, 2015, (disponível no sítio: https://bibliot3ca.com/1717-e-tudo-aquilo/).
[39] Ibid. pp. 29 e 30.
[40] Ibid. pp. 31 a 33.
[41] Cf.: KISSINGER, Henry A. O mundo restaurado. Rio de Janeiro: José Olympio, 1973, pp. 133-161; BOBBITT, Philip. A guerra e a paz na História Moderna: O impacto dos grandes conflitos e da política na formação das nações. Rio de Janeiro: Campus, 2003, pp. 512-541; HOBSBAWM, Eric J. A era das revoluções: 1789-1848. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2008, pp. 145-188 e LABROUSSE, Ernest; MOUSNIER, Roland. O século XVIII: A sociedade do século XVIII perante a revolução. História Geral das Civilizações. Tomo V, 2º v. São Paulo: Difusão Europeia do Livro, 1957, pp. 173-210.
[42] NUNES, Rizzatto. Manual de Filosofia do Direito. São Paulo: Saraiva, 2010, pp. 352-390.